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Instituto de Saúde lança livro gratuito sobre gênero e raça em versões impressa e online

12 de setembro de 2019

 

  

O lançamento da publicação “As Interfaces do Genocídio no Brasil: raça, gênero e classe”, 25ª edição da série Temas em Saúde Coletiva, ocorreu na última sexta-feira, 6 de setembro, com o auditório Walter Leser, do Instituto de Saúde, praticamente lotado, apesar da paralisação dos transportes coletivos urbanos nesse dia.

 

A publicação está disponível para download gratuito neste link. A versão impressa será distribuída aos órgãos e instituições de Saúde do Estado de São Paulo.

 

Foram compostas duas mesas com pronunciamentos de sete dos 23 autores que contribuíram para a obra. Um deles, Dennis de Oliveira, citando o pesquisador peruano Alejandro Quijano, define o território em que ocorre o massacre da população jovem e negra: “as periferias são as colônias modernas, é nelas que se estabelece a necropolítica (ocupação de territórios políticos por meio da violência) de que fala Achille Mbembe. Este estado de sítio permanente é necessário para que se mantenha a disciplina biopolítica dos corpos da sociedade de consumo no seu território”.

 

O evento reuniu ainda os sociólogos Deivison Faustino e Flávia Rios, o advogado Fellipe Rodrigues de Souza, os psicólogos Clélia Prestes e Alessandro de Oliveira Campos e o jornalista Ricardo Alexino Ferreira, todos doutores de universidades públicas em São Paulo e Rio de Janeiro.

 

Deivison discorreu sobre os critérios que definem o perfil das principais vítimas da violência em nossa sociedade a partir da literatura e da filosofia. Para ele, nas línguas latinas a morte é um substantivo feminino mas, por sua dimensão racial, ela também adquire cor. O autor se utiliza da filosofia clássica e moderna para refletir sobre violência racial urbana no Brasil.

 

Fellipe Rodrigues Sousa apresenta a evolução histórica do racismo na sociedade e, portanto, no Direito brasileiro, utilizando-se das diversas formas de instituição ou manifestação do racismo, desde o individual – mais caracterizado pelo “preconceito” racial entre pessoas – até o institucional e o estrutural, quando as instituições públicas e o próprio Estado promovem a discriminação racial subliminar. Por outro lado, as legislações antirracistas produzidas foram insuficientes para evitar esse desequilíbrio e até mesmo ocultam o racismo do aparato de Estado devido ao suposto caráter impessoal e isento das instituições públicas.

 

“O colonialismo não foi encerrado com o fim do sistema colonial”, atestou Clélia Prestes, para afirmar que, por isso, “a necropolítica está ativa e a escravização ainda é permitida, com suas violências e genocídios”. Para ela, a colonialidade do poder autoriza o extermínio das classes subalternizadas, para viabilizar os privilégios das dominantes. “A necropolítica age por meio da violência, da exploração e do extermínio. Se você perguntar a um jovem negro se o Brasil está em guerra, ele dirá que sim, e que eles são os alvos principais”.

 

A agenda dos movimentos de igualdade racial e de gênero no Brasil e do mundo foi descrita pela socióloga Flavia Rios, associada ao projeto Raça e Cidadania nas Américas e ex-pesquisadora visitante da Universidade de Princeton. Ela estabelece um paralelo entre o desenvolvimento dos movimentos feminista e antirracista com base no modelo de advocacy, ou defesa dos direitos humanos específicos de mulheres e negros. Ressalta “a importância dos programas de qualificação profissional e de sensibilização de sindicatos e empresas quanto à alocação de trabalhadores pretos e pardos”, com base em dispositivos da Organização Internacional do trabalho, que estabelece princípios de não discriminação no trabalho e no emprego. “O ponto alto do ativismo antirracista, com a participação fundamental das mulheres negras ocorreu na III Conferência Mundial contra o Racismo, a Xenofobia e a Intolerância”, realizada em Durban, na África do Sul, em 2001, quando a ação afirmativa foi escolhida para o enfrentamento das desigualdades enfrentadas pelos afrodescendentes. No Brasil, “as novas feministas, especialmente as negras, tomam as redes sociais como importantes espaços de atuação política”. Ela observa que apesar da guinada conservadora após as últimas eleições nacionais, as mulheres e negros conseguiram ocupar espaços no poder Legislativo, “constituindo-se minorias expressivas e engajadas com os movimentos sociais”.

 

O negro era notícia constante na imprensa do século XIX, notadamente das páginas policiais e dos anúncios classificados, onde eram comprados, alugados e vendidos ou acusados como criminosos. Ricardo Alexino Ferreira descreve como a imagem dos homens e mulheres negros se desenvolve ao longo da história do jornalismo brasileiro. “1988 foi um marco nessa história”, aponta ele, quando ao mesmo tempo que se comemorava o centenário da abolição da escravatura, era promulgada a Constituição que pretendia reinaugurar a democracia no país. Foi nesse momento que a imprensa redescobriu a pauta da raça, que se ampliou para a da diversidade de gênero apenas dez anos depois. O autor, no entanto, considera que a formação dos jornalistas ainda é deficiente para a abordagem correta das questões de gênero e negritude.

 

Por fim, o psicólogo e psicoterapeuta Alessandro Campos ressaltou o caráter plural das masculinidades. “Não há masculinidade, mas masculinidades. Ela é sempre plural e sempre performática”. No caso das masculinidades negras, elas “transitam pelas dimensões subjetivas da angústia e caminham por especificidades da negritude”. O autor ressalta a necessidade de se entender onde se localiza a realidade que é construída na narrativa de parte da história de vida dos homens negros. “Falar de masculinidades negras é reconhecer a negritude de sujeitos capazes de elaborar um protagonismo mais autônomo quanto às determinações históricas de uma escravidão recente e não reparada”.

 

 

 

Interfaces do genocídio no Brasil: raça, gênero e classe

 

Organização:

Marisa Feffermann, Suzana Kalckmann, Deivison Faustino (Nkosi), Dennis de Oliveira, Maria Glória Calado, Luís Eduardo Batista e Raiani Cheregatto.

 

Introdução:

Marisa Feffermann, Suzana Kalckmann, Deivison Faustino (Nkosi), Dennis de Oliveira, Maria Glória Calado e Raiani Cheregatto 

 

Parte I: Juvenicídio nas Américas

1. Juvenicido e identidades desacreditadas

 José Manuel Valenzuela

2. Juvenicidio na Colômbia

German Muñoz

3. As infanto-juventudes: "maras” e "gangues" transnacionais no Triângulo Norte-Americano-Central (TNC) - El Salvador, Honduras e Guatemala.

Alfredo Nateras

4. Juvenicidio nos EUA

Klevear Cruz

5. Genocídio da juventude Negra: desconstruindo Mitos

Marisa Feffermann

 

Parte II: A cor do homicídio

6. Reflexões indigestas sobre a cor da morte: As dimensões de classe, raça e gênero.

Deivison Faustino (Nkosi)

7. Genocídio dos Povos Indígenas no Brasil: Um Instrumento de mais de 500 Anos

Antônio Fernandes de Jesus Vieira – Dinamam Tuxá

8. Racismo e violência face à eugenia contemporânea

Weber Lopes Góes

 

Parte III: Meios de comunicação como fomentadores do medo e do preconceito

9. Narrativas midiáticas e construção da sensação de insegurança plena

Dennis de Oliveira

10. Mulheres negras, vozes insurgentes na coragem de ser, viver e lutar contra o genocídio da população negra

Isabel Cristina Clavelin Rosa

11. Etnomidialogia: ciências da comunicação e suas interseções com as diversidades étnico-sociais

Ricardo Alexino Ferreira

 

Parte IV: Encarceramento em Massa

12. Massacre e responsabilidade na democracia do encerramento em massa

Paulo Cesar Malvezzi

13. Racismo, vidas precárias e o sistema de justiça criminal como máquina necropolítica

Juliana Borges

14. Encarceramento em massa: símbolo do Estado Penal

Alfredo Nateras

15. Rés negras, juízes brancos: uma análise da interseccionalidade de gênero, raça e classe na produção da punição em uma prisão paulistana

Dina Alves

 

Parte V: Criminalização das drogas e raça

16. Criminalização das Juventudes

José Manuel Valenzuela

17. A proibição de entorpecentes na República: notas sobre eugenia, urbanização e o racismo científico brasileiro

Eduardo Ribeiro

 

Parte VI: Racismo institucional e estrutural

18. Raça e Racismo no Brasil – Uma Perspectiva Estrutural

Fellipe Rodrigues Sousa e Silvio Almeida

19. Mulheres negras enfrentamento à violência e ao racismo institucional

Vilma Reis

20. Racismo Estrutural: a produção industrial da destruição de corpos negros e não normatizáveis

Juarez Xavier

 

Parte VII: Gênero e Raça

21. Masculinidades negras e suas (des) humanidades

Alessandro Oliveira Campos

22. Feminicídio reprodutivo: ciclos de vida, raça, corpo e violência institucional

Jackeline Romio

23. Juventudes negras amefricanas: genocídio como regra, saúde como resistência

Clélia R. S. Prestes

24. Gênero e raça no Brasil (1978-2018): Movimentos Sociais, Sociedade Civil e Estado

Flávia Rios

 

Entrevistas

Alfredo Nateras Domígues

José Manuel Valenzuela Arce

 

Ilustrador

Daniel C. Oliveira (DPRAZ)

 

 

 

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